Baile Estelar

O cd do Baile Estelar reúne 12 canções presentes na trilha do espetáculo homônimo, concebido pelo diretor José Possi Neto e pelo músico Guga Stroeter, que estreou em São Paulo, em 15 de setembro de 2005. No repertório canções clássicas brasileiras das décadas 30, 40 e 50 do séc XX e algumas incursões orquestradas na música sinfônica, na tradição do folclore e das religiões afro brasileiras. As músicas foram selecionadas por Guga Stroeter e arranjadas, em sua maioria, pelo multinstrumentista Dino Barioni. A instrumentação é radicalmente acústica e é idêntica a que se apresenta no palco do musical: 4 sopros (trompete, trombone, sax alto, sax tenor), vibrafone, violão, piano, baixo acústico, bateria e percussão além das vozes solistas. Esse é mais um trabalho da orquestra HB (heartbreakers) que existe desde 1987 e realiza inúmeros trabalhos nos estilos da salsa, do jazz e da MPB. Participaram das gravações diversos e talentosos instrumentistas que costumam atuar nas apresentações da orquestra HB.

O cd abre com “Morena boca de ouro”, de Ari Barroso. A sinuosa melodia é sempre realçada pelo comportamento agressivo e jazzístico dos metais. O arranjo é de Aloísio Pontes. A voz é da manauara Cris Oliveira, que trouxe para a canção a malícia e os condimentos do norte do Brasil.

Em “O que que a baiana tem?”, de Dorival Caymmi (imortalizada em 1940 na voz de Carmem Miranda) temos um arranjo intrincado, em que a cantora Rita Braga dialoga contrapontualisticamente com a orquestra.

A terceira canção do cd é a bipolar “João valentão”, de Dorival Caymmi. Esse personagem estereotipado que surge no começo da canção; brigão, temperamental, explosivo, mostra seu outro lado romântico, contemplativo; acima de tudo baiano: podemos sentir lânguidas ondas no mar e uma boa brisa praiana. A voz é de Carl.

A faixa 4 reúne uma seleção de “sambas de roda”, tal como foram coletadas e registradas pelo quinteto violado no princípio dos anos 70 para uma série de discos para a “música popular do nordeste” produzido por Marcus Pereira. O samba de roda é um dos estilos mais antigos do Brasil, e os pesquisadores garantem que esse festejo era mesmo comum até no Quilombo dos Palmares. Pessoas juntam-se numa roda, batem palmas e cantam refrões enquanto um dançarino solista dança o miudinho no círculo e convida outro participante para entrar na roda com uma umbigada. Esses refrãos ocorrem no folclore, não tem autor nem data de composição definida, e muitas vezes são improvisados. A orquestra HB conferiu-lhe um tratamento orquestral, transformando o seu caráter porém sem perder a identidade profunda. Quem canta é o ator bailarino e cantor popular Portela, nascido e criado no Pelourinho de Salvador. A atmosfera é de generosa festa popular onde todos são convidados a celebrar.

Em “Apito no samba” combinam-se a batucada do arranjo ao estilo big band. Essa música dos pernambucanos Luiz Bandeira e Luiz Antonio foi sucesso na voz de Marlene, a rainha do rádio, em 1959 e recebeu da orquestra HB um vigoroso tratamento instrumental.

A composição de Ari Barroso, “Os quindins de Iaiá”, ficou internacionalmente conhecida por fazer parte de uma clássica cena do filme/desenho animado Você já foi à Bahia? de Walt Disney. Nos anos 40 o governo americano adotou a política de boa vizinhança, temendo a expansão do comunismo na América do sul. Walt Disney participou dessa ação produzindo essa película em que Pato Donald vem conhecer o Brasil convidado pelo papagaio Zé Carioca. Ao passar por Salvador, Donald encontra Aurora Miranda, irmã de Carmem Miranda e o grupo musical Bando da Lua, cantando e dançando Os quindins de Iaiá. O pato rabugento apaixona-se perdidamente pela mulher brasileira... No arranjo da orquestra HB alguns riffs originais são preservados mas a inovação acontece ao se justapor o maxixe carioca do sex XIX ao lado dos baques do maracatu pernambucano. A voz naive é da jovem paulistana cantora e bailarina Alessandra Papadimitriou.

“Pau de Arara” homenageia Luiz Gonzaga e o ciclo do baião, esse ritmo telúrico que na segunda metade da década de 40 inundou o Brasil com sua força regional inédita. O arranjo de Dino Barioni ressalta a dramaticidade da letra, nesta epopéia de migração tão bem descrita por Graciliano Ramos em Vidas Secas. A voz é de Cris Oliveira.

“Chão de estrelas” é uma das mais preciosas pérolas da poesia da música popular brasileira. A letra contém uma sucessão de imagens e metáforas surpreendentes, de tirar o fôlego. Esta obra prima de Silvio Caldas recebeu tratamento de gala da orquestra HB num arranjo sofisticado e sensível do jovem pianista Felipe Senna. O violão na melhor tradição seresteira é pontuado por coloridas incisões dos timbres da orquestra com efeitos que evocam a visualidade inerente à composição. Quem canta é Carl

O arranjo de Dino Barioni para “Vatapá”, de Dorival Caymmi tem como diferencial o interlúdio “salsero”, já que há tantos anos a orquestra HB dedica-se a tocar ritmos latinos. E esse Vatapá com cheiros e temperos recebe novos ingredientes. A voz é de Cris Oliveira.

“Xaxará” é uma composição de Dino Barioni sobre o ritmo opanijé do candomblé brasileiro para Obaluaê. Num clima misterioso a orquestra tece variações sobre a percussão repetitiva e mântrica.

A penúltima faixa do cd é, talvez a maior ousadia do álbum: um trecho recortado do “Choro 7”, de Villa Lobos foi adaptado para orquestra sobre uma percussão intensa em 12 X 8, evocando a polirritmia africana. O resultado é provocador e instigante.

O disco se encerra com “Oxaguian”, um arranjo de Dino Barioni para uma coleção de cantos do candomblé para o Oxalá Menino. O ritmo hipnótico é o do ijexá baiano e a voz é da trombonista e cantora cubana Liena Hernandez, que visita o Brasil e participa do musical Baile Estelar a convite de Guga Stroeter e a orquestra HB. Nada mais adequado e convergente: em Cuba, Liena pratica a santeria, que corresponde ao candomblé brasileiro, e que dedica cantos e toques de tambores muito semelhantes aos presentes em nossa cultura profunda.

O cd do Baile Estelar é, uma viagem aos diferentes tempos e regiões do Brasil. As melodias, assim como os compositores e os jovens interpretes, são oriundos das mais distintas localidades, trazem em seu âmago todo tipo de influências. E essa beleza de mestiçagem que tanto espetáculo musical e o cd do Baile Estelar procuram transmitir a platéias de todas as gerações.

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